O Papel da Imuno-Histoquímica na Medicina de Precisão: Aplicações, Desafios e Relevância Clínica
Publicado em: 17/07/2025, 12:05

A imuno-histoquímica (IHC) é um pilar essencial da medicina de precisão, especialmente devido à sua capacidade de detectar proteínas específicas, que direcionam diagnósticos e alvos terapêuticos. Essa técnica integra a morfologia tumoral à biologia molecular de maneira acessível e reprodutível, orientando desde o diagnóstico diferencial até a indicação de terapias-alvo e imunoterapias. A IHQ pode atuar como teste de pesquisa indireta de alterações gênicas, o que teria alto custo e demandaria muito tempo com exames moleculares complexos.
Companion Diagnostics: Diagnósticos que Guiam a Terapia
Os chamados companion diagnostics (CDx) são testes diagnósticos validados e aprovados para guiar terapias específicas. A IHC se destaca entre os CDx pela sua ampla aplicabilidade, custo relativamente baixo e rápida disponibilidade de resultados.
Alguns dos biomarcadores acionáveis, que indicam terapias específicas baseadas em alvos moleculares, são o HER-2, cuja análise faz parte obrigatória do tratamento do câncer de mama, mas em estudos recentes tem mostrado um grande potencial como marcador agnóstico para tumores sólidos de outras topografias. Outros exemplos que podemos citar é o PD-L1 em vários tumores com elegibilidade para imunoterapia com inibidores de checkpoint; ALK e ROS1 em câncer de pulmão; Claudina 18.2 no câncer gástrico; IDH1, R132H e ATRX em gliomas; instabilidade de microssatélite (MLH1, MSH2, MSH6, PMS2) para rastreamento de síndrome de Lynch; BRAF V600E, cuja análise rastreia a presença da mutação sugerindo tratamento com inibidores de BRAF/MEK em melanoma, câncer colorretal e gliomas; além de proteínas de fusão em sarcomas, resultando em diagnóstico específico com menor custo.
Essa integração entre diagnóstico e tratamento é central para a medicina de precisão e requer interpretação padronizada e contextualizada do patologista.
Integração com Tecnologias Avançadas e com a Inteligência Artificial
O avanço da patologia digital trouxe novas perspectivas para a interpretação da IHC.
Ferramentas baseadas em inteligência artificial permitem quantificação automatizada da coloração, melhorando a reprodutibilidade e diminuindo a variabilidade interobservador. A IHQ está sendo integrada com métodos de alta tecnologia, como técnicas de imunofluorescência multiplex, que permite avaliação simultânea de múltiplos marcadores no mesmo tecido. Apesar da complexidade, tem potencial de se tornar acessível devido ao uso da imagem digital assistida pela inteligência artificial, o que permite a análise do microambiente tumoral com um nível de detalhamento superior à capacidade da análise humana isolada.
Além disso, a integração com a patologia digital por meio de uso de sistema de gerenciamento de imagem assistido por inteligência artificial também melhora a padronização, quantificação e interpretação das alterações histológicas e imunofenotípicas. Essas plataformas de digitalização permitem o compartilhamento remoto de lâminas e segunda opinião com especialistas, além de oferecerem a possibilidade de laudos integrados e automatizados, que combinam dados de IHC, clínicos e moleculares em relatórios estruturados e personalizados. Com a padronização da digitalização e análise de lâminas, espera-se que a IHC se torne ainda mais precisa e escalável.
Desafios na IHQ
Apesar das vantagens, a IHC enfrenta desafios técnicos e interpretativos. As principais limitações incluem a subjetividade da interpretação, especialmente quando sem assistência de ferramentas tecnológicas; variações pré-analíticas e falta de padronização interlaboratorial.
A fase pré-analítica é responsável por grande parte das divergências encontradas nos laudos histopatológicos, podendo comprometer significativamente a confiabilidade da IHQ. O principal fator de interferência inclui atraso na fixação e ou fixação inadequada com uso de fixador diferente de solução de formol tamponado a 10%, o que ocasiona degradação de epítopos e instabilidade das proteínas. Esses fatores podem causar falsos positivos/negativos, levando a decisões clínicas incorretas. Diferenças nas plataformas, clones de anticorpos e métodos de coloração dificultam comparações diretas. Essas limitações reforçam a importância do controle de qualidade, uso de protocolos validados e capacitação contínua dos profissionais envolvidos.
Conclusão
A IHC é muito mais que uma técnica complementar. É uma ferramenta central da medicina de precisão, fornecendo dados morfológicos e moleculares que guiam decisões diagnósticas e terapêuticas individualizadas. Com o avanço das tecnologias digitais e maior integração com análises moleculares, seu impacto só tende a crescer. No entanto, sua efetividade depende da padronização rigorosa, especialmente na fase pré-analítica, para garantir resultados confiáveis e clinicamente úteis. O papel do patologista também se expande além da análise morfológica, contribuindo para uma atuação mais ativa na interpretação integrada de dados moleculares, clínicos e morfológicos. Assim, dominar a IHC e suas aplicações é indispensável para os profissionais que desejam se posicionar na vanguarda da oncologia personalizada.
Autor: Éber Emanuel Mayoral – Médico Patologista – CRM-SP156047.